Pesquisa e realidade

“... acho que só há um caminho para a ciência — ou para a filosofia: encontrar um problema, ver a sua beleza e apaixonarmo-nos por ele; casarmo-nos com ele, até que a morte nos separe — a não ser que obtenhamos uma solução. Mas ainda que encontremos uma solução, poderemos descobrir, para nossa satisfação, a existência de toda uma família de encantadores, se bem que talvez difíceis, problemas-filhos, para cujo bem-estar poderemos trabalhar, com uma finalidade em vista, até ao fim dos nossos dias.” - Karl R. Popper.

Pesquisa é a atividade básica das ciências na sua indagação e descoberta da realidade. É uma atitude e uma prática teórica de constante busca que define um processo intrinsecamente inacabado e permanente. É uma atividade de aproximação sucessiva da realidade que nunca se esgota, fazendo uma combinação particular entre teoria e dados.

Pesquisador

É considerada um questionamento sistemático crítico e criativo, assim como uma intervenção competente na realidade. Consisti, portanto, em um diálogo crítico permanente com a realidade em sentido teórico e prático, compreendendo um conjunto de ações, propostas para encontrar a solução para um problema.





Ciência e Pesquisa

Linguagem, conhecimento e realidade

Os seres humanos são seres lingüísticos e sociais. A linguagem é um fenômeno cognitivo e social que faz do ser humano o tipo particular de ser que é. A linguagem possui um caráter criador. Ela não só descreve como cria realidades. A linguagem é, assim, ação, modelando o futuro, a identidade e o mundo em que se vive. O ser humano constrói a si mesmo na dinâmica da linguagem. O ser humano não é, então, uma forma de ser determinada e permanente: é um espaço de possibilidades que se cria e recria por meio da linguagem.



Grupos Sociais

Os grupos sociais, por sua vez, são fenômenos lingüísticos, construídos a partir de conversações específicas, que se baseiam na capacidade dos seres humanos de efetuar compromissos mútuos quando se comunicam entre si. Um grupo social é uma rede dinâmica de conversações. Como tal, gera uma identidade no mundo que transcende a seus membros individuais. Tudo em um grupo social pode ser entendido e melhorado a partir das conversações. Os membros de uma equipe são agentes conversacionais e a ação de um grupo, assim como o seu processo de aprendizagem são permeados por um jogo conversacional.

Toda reflexão que fazemos na busca do conhecimento se faz necessariamente dentro da linguagem. Vivemos imersos na linguagem e nela nos movemos. Toda tentativa de conhecer se dá dentro de uma forma particular de conversação, que é um instrumento cognitivo para reflexão sobre a realidade.



Comunicação e representação de si e do mundo

Conhecimento

“O conhecimento científico, como a linguagem, é intrinsecamente a propriedade comum de um grupo ou então não é nada. Para entendê-lo, precisamos conhecer as características essenciais dos grupos que o criam e o utilizam.” – Thomas Kuhn

O sujeito observador n ão poder ser absolutamente autônomo e imparcial em relação à experiência, pois o objeto de observação não pode ser alcançado como coisa-em-si, mas tão somente como representações, que são projetadas pelo próprio observador sob o filtro de toda sorte de juízos subjetivos que incluem os determinantes sociais, históricos, étnico-geográficos e culturais que fazem do observador um reflexo do seu tempo e do seu espaço sócio-geográfico.



Conhecimento

A própria ciência é uma conjunto de  “paradigmas” ou “matriz disciplinar”, que são os modelos mentais coletivos que de certo modo constituem e distinguem a comunidade científica. Essa matriz disciplinar seria uma composição de elementos de várias espécies, dentre outros, os seguintes:

  • as generalizações simbólicas, que são expressões lógicas, que também podem ser expressas em palavras, consensualmente utilizadas;
  • compromissos coletivos com crenças em determinados modelos, fornecendo ao grupo as analogias ou metáforas preferidas ou permissíveis;
  • valores compartilhados, que permitem julgamentos quanto a acuidade, simplicidade, coerência interna e externa, plausibilidade na escolha de uma teoria;
  • exemplos compartilhados, que são soluções concretas de problemas partilhadas por meio da interação dentro da comunidade científica.

Representações da realidade

“Não sabemos como as coisas são. Somente sabemos como as observamos ou como as interpretamos. Vivemos em mundos interpretativos.” - Echeverría

O conhecimento da coisa-em-si como essência não está ao nosso alcance e só podemos alcançar aquilo que observador observa e interpreta o objeto observado. Podemos alcançar apenas as representações que o sujeito faz do objeto observado e não a coisa-em-si. Torna-se também objeto de preocupação, assim, conhecer o observador que fala sobre o objeto, sua condição de ser humano, distinções e suas interpretações sobre o objeto, em vez de procurar conhecer a essência do objeto sobre o qual se fala.



Percepção da realidade e Conhecimento

Cada observação sobre um fato ou objeto se desvenda (se dá a conhecer) a alma (entendida como a forma particular de ser) de quem fala. Quando se fala, revela-se o observador que se é. Os seres humanos vivem, assim, em um mundo de interpretações ou representações.

Esse deslocamento do centro de gravidade da inquirição do conhecimento das coisas para o conhecimento do observador permite ao observador não só questionar como as coisas lhe parecem ser, mas também questionar o tipo de observador que é nos diversos domínios em que se constitui. Isso desloca a perspectiva de conhecimento, na consideração da realidade, da essência da coisa observada para a perspectiva do conhecimento do observador.



Diferentes representações da realidade

A Figura ilustra a diferença de perspectiva que cada observador, com suas distinções, concepções, juízos próprios, sua história, têm do mundo, dos outros e de si mesmo no processo de observação, constituindo uma representação ou visão interpretativa do conjunto das impressões que recebe. Essa figura se propõe a traduzir que, recebendo impressões do mundo sensível, diferentes observadores, embora compartilhem uma “realidade comum”, pois são dotados do mesmo padrão biológico de sistema nervoso, constituem representações ou visões diferentes desse mundo observado. Na figura, cada observador está dentro de um “círculo” particular, que traduz o âmbito da representação ou visão de mundo projetada, que são os mundos interpretativos onde vivem.

Conhecimento, modelos mentais e observador

“O conhecimento é sempre um juízo que faz um determinado observador, ao observar determinados comportamentos. Se o conhecimento reside em algum lugar é no juízo que um observador faz, ao observar comportamentos. Mais: o conhecimento surge precisamente como uma maneira de qualificar (de julgar) o comportamento observado.” - Echeverría

Segundo Humberto Maturana, “tudo o que é dito é dito por alguém”, dando destaque para o fato de que é uma ilusão querer apresentar um objeto com independência do sujeito. Da mesma forma, tudo o que é conhecido é conhecido por alguém, destacando o papel do observador no processo de concepção do conhecimento. A observação da realidade está, assim, condicionada pelos “conhecimentos prévios”, modelos ou categorias mentais do sujeito observador.

A concepção de conhecimento como verdade absoluta, um reflexo objetivo e independente da realidade, é deslocada, portanto, para uma concepção relativística do conhecimento em função do observador.



Modelos Mentais

O “conhecimento prévio” influencia “o conhecimento novo”, ou seja, há uma dependência do mecanismo de interpretação em relação a própria história pessoal do sujeito, suas vivências, crenças, valores e conhecimentos.

Peter Senge chamou esse “conhecimento prévio” de modelos mentais, dizendo que “são pressupostos profundamente arraigados, generalizações, ilustrações, imagens ou histórias que influem na nossa maneira de compreender o mundo e nele agir”.

Esse contexto mental é, assim, o conjunto de experiências, conhecimentos, regras de raciocínio, inferências, entre outros, que influem na interpretação que se faz em qualquer situação em que a mente é desafiada a ajuizar e a agir, nas mais diversas situações.



Mundos Interpretativos

Esses modelos mentais operam também de um modo subconsciente, permeando toda as dimensões da vida da pessoa, sendo responsável pela síntese do entendimento.

Os modelos mentais condicionam, portanto, todas as interpretações e ações de uma pessoa, inclusive nos domínios técnicos, profissionais e científicos. Daí a importância de se estudá-los e de se tomar consciência da influência deles.

Os modelos mentais funcionam como filtros da realidade que provêm de quatro fontes: a biologia, a linguagem, a cultura e a história pessoal.



Fontes dos Modelos Mentais

Pesquisa

“Além da mente humana e como um impulso livre, cria-se a ciência. Esta se renova, assim como as gerações, frente a uma atividade que constitui o melhor jogo do "homo ludens": a ciência é, no mais estrito e melhor dos sentidos, uma gloriosa diversão.” -  Jacques Barzun